As tragédias anunciadas como consequências do perigoso jogo da moda, que pode levar ao suicídio, nos fazem refletir e trazem à lembrança cenas da nossa adolescência e início de juventude. Tínhamos jogos interessantes em que compartilhávamos as mesmas regras e tabuleiros com amigos; tempo em que o nosso mundo era um sonho, sem muitas preocupações, além da explicação a ser dada pela nota baixa no boletim (isso mesmo: boletim escolar! Lembram dele?).
Eram tempos em que corríamos de casa em casa, tomávamos água de torneira, e em que ‘roubar’ bandeira era só uma brincadeira, um desafio de conquistas, em que as regras eram iguais para todos e ninguém se sentia usurpado ou lesado. E nossos melhores amigos eram os primos, os vizinhos, os colegas de escola.
Tempos em que não tínhamos tempo de pensar em morte, porque estávamos muito ocupados em sermos felizes e compartilhar alegrias. Na vida real.
Hoje a adolescência é a essência da inércia (salvo pequenas exceções) – e do egoísmo também, de ambos os lados. Trancados no mundo próprio e sombrio durante a maior parte do dia e da noite, os adolescentes vagam pela casa nas madrugadas a procura de alimentos – gostam desses hábitos noturnos, provavelmente para não cruzar com os pais e ter que encarar perguntas em um diálogo real.
Por outro lado, os pais parecem fechar os olhos para não entender que, embora evitem perguntas e respostas, esses adolescentes clamam por socorro, num grito tão alto que os decibéis não deixam nossos ouvidos escutar – ou porque não queremos escutar. No nosso mundinho profissional, vamos, de forma célere, virtualizando a amizade com nossos filhos.
Foi preciso o grito da baleia para prestarmos atenção na existência de erros que estão acontecendo há muito tempo, dentro da nossa própria casa. E percebermos que precisamos remediar e cuidar da prevenção. Independente do título do jogo – ou se joga algum jogo – nossos jovens estão morrendo por suicídio e depressão e não têm com quem desabafar.
A tal “Baleia Azul” foi apenas a gota d’água que faltava em um poço que transborda solidão. E esse transbordamento em forma de tragédias nos traz o alerta: Precisamos estar mais perto dos nossos filhos de forma real, persistente e participativa – e não deixar que as mensagens dos desconhecidos ‘amigos’ virtuais – que os cercam por diversos canais das chamadas redes sociais – substituam nossos conselhos e afagos.
Afinal, não é só uma baleia. É um oceano inteiro, profundo, desconhecido e perigoso, em que deixamos nossos filhos mergulhar sem medir a dimensão das tempestades e monstros que eles poderão encontrar. E nem se estão preparados para isso.
Na solidão desse oceano, muitos submergem e não conseguem mais emergir.
- Texto de Armando Durval