O que dizer de um Congresso que aproveita a madrugada de um país em comoção e, longe dos olhares da imprensa, desvirtua totalmente um projeto de combate à corrupção, vira-o pelo avesso e dá a ele nuances que dificultam esse trabalho?
Nada! Apenas se constata que esse país virou de ponta cabeça. Malandramente. O povo quer que se punam os corruptos e o Congresso manda punir juízes e promotores ‘por abuso de autoridade’.
O problema está na subjetividade do que seria abuso de autoridade. Investigar político corrupto? Indiciar quem pratica corrupção ativa e passiva, abuso de poder, compra de voto? Mandar para a cadeia quem sonega informações fiscais; acumula riqueza mandando dinheiro sujo para o exterior; torra o dinheiro público em farras e jóias?
Não! Eles são cobertos pela imunidade parlamentar – que aliás, rima com impunidade. Desculpem o trocadilho – mas é mesmo pra lamentar!
Tudo pode acontecer. O texto-base do pacote de medidas contra a corrupção, que nasceu do Ministério Público, com o apoio de mais de 2 milhões de brasileiros, ficou longe, muito longe do texto aprovado pela Câmara, na sessão conduzida pelo presidente Rodrigo Maia, aproveitando o silêncio da madrugada. O projeto foi votado e aprovado, mas está totalmente DESFIGURADO.
Na noite desta quarta-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros, tentou usar a mesma manobra e acelerar a votação para aprovar o texto desfigurado, também na calada da noite. Mas foi barrado. Voto vencido por maioria absoluta – ainda bem!
Mas isso não significa que as alterações feitas na Câmara, serão derrubadas no Senado – quem dera fosse assim! Mas os interesses são os mesmos, em boa parte dos ocupantes das duas casas lehislativas: barrar a Justiça e o Ministério Público – e isso está presente em pelo menos oito situações do novo texto: entre elas a que os juízes e promotores não poderão se expressar por qualquer meio de comunicação, sobre processos pendentes de julgamento. Pena: Seis meses a dois anos de prisão e multa.
Os membros do MP podem responder por promoverem a instauração de procedimentos sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito. Estarão sujeito a sanções penais e a indenizar o denunciado por danos morais, materiais ou à imagem. Vão encarar?
A impressão é de que a mordaça vai ganhando terreno para a perpetuação da corrupção.
Tomara que não!