Considerado anda infeliz. Tem razões de sobra para isso. A namorada o deixou, foi dispensado do cargo em comissão que tinha em uma Prefeitura tucana do interior, a mãe anda com síndrome do pânico e a avó, dona Nildinha, único apoio que tem, está em um relacionamento “sério” com Zé Fumacê.
Ele apareceu no bar e restaurante do Clóvis “Gabi” trajando uma bermuda cor de rosa, pra lá de surrada, uma camiseta preta em estado de aposentadoria, sandálias japonesas e a barba por fazer.
A primeira pessoa que encontra logo na entrada foi o “Ôio de Kombi”. que estava curtindo os prazeres do seu cigarro Carlton. – Meu garoto, lhe estimo, gosto e quero bem, mas passou um Jeep por cima de você?
Considerado fez que não entendeu a pergunta e partiu para “a mesa da diretoria”, onde outros amigos estavam reunidos, sob a batuta do líder Davan Tonelada. Mal cumprimentou os companheiros da mesa e pediu uma vodka com uma pimenta dedo de moça dentro do copo. A turma ficou assustada. De olhos tão arregalados pareciam todos da família de “Ôio de Kombi”.
-Vodka com pimenta vermelha. O senhor tomou esse drink na Europa magistrado? – Perguntou Davan.
-Não. Esse daí deve ser drink de petista vagabundo. -Disse o juiz alisando a vasta cabeleira.
-Tenha calma, Dr juiz. Deixe o garoto, ele deve estar com problemas. – Ponderou o Pastor.
Considerado tomou o trago de uma lapada só. Em seguida puxou a pimenta do fundo do copo e mastigou, ante as caras assustadas dos companheiros de farra.
Padrasto do Batoré, Silvio Paizinho alisou a cabeça do jovem Considerado e perguntou o que estava acontecendo. – A gente sabe que você sempre foi estranho, mas desse jeito você deixa todos nós preocupados. O que está havendo?
Logo após pedir outra dose idêntica ao Gabi, Considerado contou aos amigos que sua vida estava pelo avesso. Os insucessos pareciam contínuos. A tese dele é que precisaria fazer uma revolução interna no organismo, para poder assimilar direito os acontecimentos.
-Eu não disse que isso era coisa de comunista. Lá vem ele com essa história de revolução.
-Não é nada disso, Dr. Magistrado. Eu quero mais é queimar os fluidos negativos do meu interior, fazer do meu estômago um braseiro de carvão para depois recomeçar das cinzas.
-Se não morrer antes, né Considerado? – Advertiu o Pastor.
-O problema dele é o carvão. – Provocou o Batoré.
E de fato. A mãe, a namorada, o desemprego, a falta de dinheiro, enfim, tudo isso ele absorveria com naturalidade e partiria para a superação. Mas, o fato de dona Nildinha está de caso com Zé Fumacê, o rei do carvão, ele não conseguiu administrar. O Carvão é uma “boate” na Levada, em Maceió, onde o Fumacê tem ido com a avó do Considerado nos fins de semana para altas farras. Louco para saber das histórias, Silvio Paizinho pergunta:
-É verdade essa história de sua avó com o Zé Fumacê?
-A minha avó endoidou Dr. Silvio…
-Mas ela está se divertindo…
-O senhor acharia bom se a sua avó estivesse se divertindo num puteiro?
– Mas ela está acompanhada pelo namorado…
-Namorado que se preza leva a namorada para o Maria Antonieta não para um inferninho na Levada…
-Mas você falou com ela?
-Não adianta nada. O Fumacê virou a cabeça dela.
-Como assim?
-Dia da estreia do Brasil na Copa, ele foi buscá-la em casa para assistirem ao jogo juntos.
-Você foi com eles?
-Fiquei morto. Minha avó saiu de shortinho tipo pijama branco, uma camiseta de alças com a estampa da bandeira do Brasil e eu me revoltei.
-Por quê?
-Na bandeira, no lugar de ordem e progresso, estava escrito: Ordem e Fumacê no Carvão.
–